sábado, 28 de maio de 2011

Sergio Teperman fala dos desafios da construção do CAU

Como nosso conselho precisa ser
Por Sergio Teperman

Sabem Israel, aquele país que, embora tenha só o sul, insiste em dizer que lá existem os quatro pontos cardeais?

Uma vez, foi perguntado a um turista norte-americano o que pretendia fazer em sua estada no país. Tendo recebido a resposta de que o homem gostaria de fazer um tour por todo o território, perguntaram-lhe, então, o que pretendia fazer na parte da tarde...

Naquela época, Israel passava por uma horrível crise de economia, com uma inflação desenfreada em razão das despesas de guerra. Uma inflação no nível das famosas inflações brasileiras, com a diferença de que em Israel admitia-se que essa inflação existia mesmo.

Houve, certa vez, um debate famoso no parlamento israelense (não israelita, nem judeu, e que absurdo essa mania de confundir religião com nacionalidade... Se fosse assim, nós não seríamos mais brasileiros; seríamos evangelistas em nossos tristes estádios de futebol, que seriam transformados em superigrejas).

Pois no parlamento de Israel discutia-se a crise econômica do país, quando com o típico humor (agridoce) - aí sim, judeu - um deputado sugeriu: por que não declaramos guerra aos Estados Unidos? Eles jogam meia dúzia de bombas, põem um monte de dinheiro para financiar a guerra, e depois um monte de dinheiro para reconstrução do país e isso resolve a nossa economia. Estava tudo muito bonitinho até que um engraçadinho se levanta e pergunta: ok, mas e se ganharmos a guerra?

É o que acontece agora: de tanto insistirmos, o Lula, no dia de ir embora, joga a bomba do CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo) em nossas mãos. E nós aí, CRAU!!! Afffirrrmamos com todos os effes e erres, que não sabemos no que vai dar esse presente de grego com que nos contemplaram. Vejo essa questão por dois lados: o lado da sociedade e o lado dos profissionais.

Do lado da sociedade, vem ficando cada vez mais claro que os conselhos profissionais destinam-se a protegê-la, e que só faz efetivamente sentido regulamentar profissões cujo exercício possam em algum momento pôr em risco a vida de seus usuários. Por exemplo, profissionais regulamentados como: médicos, engenheiros, certos setores da ciência, pilotagem de aviões e embarcações etc. Para outras profissões existem proteções, mas não leis que impeçam profissionais não formados de exercê-las.

A arquitetura não se enquadra nessa lista de profissões protegidas, mesmo que alguns mais suscetíveis tenham um ataque.

E, ao ver alguns dos trabalhos dos nossos arquitetos e o valor de alguns projetos de edifícios de apartamentos e de escritórios, tenho certeza tratar-se de um caso de masoquismo.

Temos de ser lúcidos e lembrarmos que jamais ajudaremos a sociedade se não formos devidamente representados pelos nossos conselhos.

Visto do lado dos profissionais, o conselho técnico tem o poder de parar com essas nojentas RTs, que nos denigrem e que distorcem o mercado. Enfim, o conselho poderá ser um BomBril da profissão em todos os sentidos.

O conselho poderá preparar cadastros dos projetistas para instalações, assessoria, concorrências de obras, regulamentar o valor e a cobrança dos honorários, obrigando a todos a respeitar tabelas e contratos, proibir concursos de arquitetura etc. Ou poderia, como fazem hoje, não fazer nada e pagar salários a seus diretores e seus funcionários.

O dono do escritório em que trabalhei em Oslo virou eterno presidente do conselho local e transformou todas as porcentagens em um valor único de 7%, independentemente do tipo de trabalho, complexidade etc. Dizia que os projetos mais fáceis compensavam os outros difíceis e menores em tamanho, para os quais 7% não pagavam o trabalho. John Engh, esse magnífico arquiteto norueguês, projetou a embaixada da Noruega em Brasília (1984) e atuou como arquiteto local da embaixada norte-americana em Oslo (projeto de Eero Saarinen).

John Engh era uma personalidade internacional, capaz de juntar, em sua casa, personalidades como os ganhadores do prêmio Nobel, que todos os anos realizam sua cerimônia em Oslo. Foi assim que conheci, em um jantar, o cientista Linus Paulin e vários outros Nobel (que vergonha de quem não lembro mais o nome).

Mas há um lado em que tenho pensado; é que, além de defender a sociedade, o conselho poderia ser importante na defesa dos seus profissionais no dia a dia.

O conselho poderia ser também como era na Espanha, onde se garante a qualidade do trabalho e a correção do valor do contrato, devendo porém todos os contratos de projetos assinados serem submetidos ao conselho, que verifica o cumprimento de suas obrigações. Em resumo, o conselho praticamente atua como um juiz, na defesa do melhor tanto para o cliente quanto para o profissional.

Assim, a face aparente de protetor da sociedade do CAU requer que sejamos também por ele protegidos.

Havia um diretor de faculdade que dizia que, para ter sucesso, Maquiavel era lúcido e não maquiavélico. Meu caro Lúcio, para ter sucesso precisamos não somente ser lúcidos mas principalmente maquiavélicos.
 
Fonte: FNA

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